Lula e Dilma não davam um pio sem pedir a bênção do vice.
Todo mundo sabe que Dirceu morria de medo de Temer.
O país do carnaval foi salvo do marasmo pelo
procurador-geral da banda.
Isso aqui estava um tédio de dar dó. Depois do golpe de
Estado que arrancou do palácio a primeira presidenta mulher, cuja quadrilha
estava roubando honestamente sem incomodar ninguém, a sombra desceu sobre o
Brasil. Um mordomo vampiresco entregou a Petrobras a um nerd que deixou os pais
de família da gangue do Lula no sereno — extinguindo sumariamente o pixuleco,
principal direito trabalhista conquistado na última década.
Mas não foi só isso. Além de arrancar a maior empresa
nacional da falange patriótica de José Dirceu, o governo golpista da elite
branca e velha deu um tranco na economia. Em pouco mais de um ano, estragou um
trabalho de três mandatos presidenciais que levara o país a um recorde — a
maior recessão da sua história. Enxotou do comando da tesouraria nacional todos
aqueles cérebros amanteigados, e aí se deu o choque: inflação e juros caíram,
dólar e taxa de risco idem. Uma tragédia.
Como se não bastasse, o mordomo começou a fazer as reformas
estruturais que passaram 13 anos na geladeira do proselitismo coitado, que é o
que enche a barriga do povo. Antes que o pior acontecesse — a retomada do
emprego e do crescimento — apareceu Rodrigo Janot.
Mas não apareceu sozinho, que ele não é bobo e sabe que com
elite branca e velha não se brinca. Veio com o caubói biônico do PT — aquele
vitaminado por injeções bilionárias do BNDES, o brinquedo predileto do filho do
Brasil. Só mesmo um caubói de laboratório teria a bravura suficiente para dizer
ao país que comprou todo mundo e o culpado é o mordomo. A partir daí foi só
alegria.
A dobradinha do procurador-geral da banda com o supremo
tribunal companheiro nunca foi tão eficiente. A enxurrada de crimes da
Lava-Jato envolvendo atos diretos e indiretos de Dilma Rousseff passou dois
anos morrendo na praia. Já a homologação da pegadinha do caubói caiu do céu
como um raio. Aí o delator foi amargar o exílio no seu apartamento em
Manhattan, deixando o país paralisado, mas feliz — como no carnaval.
Nesta revolução progressista, também conhecida como farra do
boi, Joesley Batista apontou Michel Temer como o chefe da quadrilha mais
perigosa do país. Os brasileiros já deviam ter desconfiado disso. Lula e Dilma
não davam um pio sem pedir a bênção do vice. Todo mundo sabe que Dirceu morria
de medo de Temer, e não deixava Vaccari, Delúbio, Valério, Duque, Bumlai,
Palocci e grande elenco roubarem um centavo sem pedir a autorização do mordomo.
Chegaram a pensar em denunciá-lo à Anistia Internacional, mas se calaram
temendo represálias. Já tinham visto no cinema como os mordomos são cruéis.
Agora estão todos gratos ao caubói biônico, que por sua vez
está grato ao procurador-geral da banda — e ao seu homem de confiança que saiu
do Ministério Público para montar o acordo da salvação da boiada (sem
quarentena, que ninguém é de ferro). O pacto que emocionou o Brasil, festejado
nas redes sociais como Operação Free Boy, é um monumento à liberdade talvez só
comparável à Inconfidência Mineira.
Nada seria possível sem o desassombro de Edson Fachin, o
homologador-geral da banda. Um candidato a juiz capaz de circular no Senado a
reboque do lobista de Joesley não teme nada.
O legal disso tudo, além de bagunçar esse governo recatado e
do lar com mania de arrumação (a melhora dos indicadores estava dando nos
nervos), foi ressuscitar o PT. Depois da delação de João Santana, o roteiro
criminal sem precedentes elucidado por Sergio Moro se encaminhava para a prisão
de Lula e Dilma — os presidentes do escândalo. Aí veio a farra do boi dizer ao
Brasil que, na verdade, Lula e Dilma eram coadjuvantes do mordomo — quem sabe
até laranjas dele. E o Brasil, como se sabe, crê.
Alegria, alegria. Zé Dirceu solto, Vaccari absolvido pela
primeira vez na Lava-Jato, pesquisas indicando aumento de aceitação ao PT! (Ok,
é Datafolha, mas o Brasil crê). E você achando que não viveria para ver rehab
de bandido. O auge da poesia foi o lançamento da denúncia de Janot em
capítulos, como uma minissérie. Alguns especialistas classificaram-na como
“inepta” (ou seja, a cara do pai), mas estão enganados. A denúncia de Janot é
apenas um lixo. Quem gosta de inépcia é intelectual.
A alegação de corrupção passiva, por exemplo, é uma espécie
de convite à investigação do Cade. Só faltou escrever “tem coisa estranha
ali...” Um estudante de Direito poderia achar que quem denuncia sem apurar está
cambaleando entre a negligência e a falsidade ideológica. Algum jurista na
plateia?
Farra do boi não tem jurista. Tem quadrilha dançando em
torno da fogueira de mais uma greve geral cenográfica, porque sacanear o país
nunca é demais. Mas eis que chega um correio do amor para o procurador-geral do
bando (devem ter errado a grafia). Vamos reproduzi-lo: “Companheiro, agora dê
um jeito de completar o serviço e botar esse presidente na rua, depois em cana;
acabe com ele, parceiro, porque dizem que maldição de mordomo é terrível. Só
não é pior que a de mordomo-vampiro.”
Guilherme Fiuza é jornalista
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