Foto: Reprodução/Facebook
Por: Maiara Liberato
Adoção é o encontro do abandono de um com a solidão do outro. Achei linda essa frase, atribuída a Divaldo Franco e penso que não poderia começar esse texto de forma melhor. Pois a adoção busca preencher os vazios deixados de cada lado, ao amparar e acalentar a criança que não têm genitores e, ao mesmo tempo, suprir a carência dos pais com dificuldades para conceber naturalmente ou que, apenas, desejam ter mais filhos, sem que seja necessário engravidar.
Estudos apontam que, para a maioria das famílias que decidiram adotar uma ou mais crianças, o preconceito interno é quase inexistente. Colocações como “esse é meu filho biológico e esse é meu filho adotivo” não costumam fazer parte da rotina, na maioria dos casos. “Filho é filho! Não tem diferença! O amor é igual”, é o que dizem os pais e o que reforça o publicitário e economista Renato Tourinho, que acrescenta “Eu tenho duas filhas e uma delas eu fui buscar! A vontade era tão grande que você ultrapassa todos os limites. Amo as duas de paixão, não tem nenhuma diferença”.
Boa parte do mito que se cria em torno da adoção como algo delicado e difícil, deriva da lente de aumento dada pelos veículos de comunicação em torno dos casos que não deram certo ou que acabaram em tragédia. Mas, acontecimentos dessa natureza ocorrem em qualquer família e em maior número nas biológicas, sobretudo quando envolve disputas de herança, mas esse é um outro assunto.
Problemas entre pais e filhos e entre irmãos sempre existiu e vai continuar acontecendo. Mas isso nada tem a ver com a questão da falta de consanguinidade. Laço de sangue não é pré-requisito para relacionamentos saudáveis e harmônicos.
MOTIVAÇÃO DA ADOÇÃO
Um ponto relevante a ser abordado quando se fala nessa temática é a motivação que levou os pais a optar pela adoção. Essa questão tem uma relação direta com a forma como mãe e pai irão construir a sua relação parental. Se há uma vontade genuína, a chance de êxito aumenta substancialmente e a adoção é vista com tranquilidade, sem haver espaço para que o filho se sinta preterido com relação aos irmãos, caso existam.
Como bem colocou o terapeutajunguiano e escritor, Djalma Argollo, é preciso desconstruir alguns preconceitos em torno do filho adotivo e tirar esse estigma de ‘coitado’. “Um erro fundamental, às vezes, está na forma como pai e mãe veem o filho adotado. Pai e mãe não podem tratar o filho como coitadinho. Eles criam um problema para o filho. A própria adoção tirou o filho do ‘coitadinho’ “, enfatiza.
Quando a motivação não advém de um sentimento maior, mas pode ser fruto da tentativa de manter uma relação desgastada, ajudar uma criança órfã e tantas outras situações, as chances de ter problemas são maiores. Tourinho também tocou nessa questão ao dizer “Eu acho que se a adoção dá errado, começa errado. A partir do momento que você escolhe e vai buscar, tem amor. Se houver alguma coisa errada, tem que olhar o que foi errado no caminho e não no processo”.
PREPARAÇÃO É FUNDAMENTAL
Ao contrário do que se pensa, é necessário haver uma preparação de toda a família para receber uma criança, sobretudo adotiva, e criar condições emocionais e psicológicas para todos os envolvidos: pais, irmãos e parentes, sobretudo os próximos. Ainda mais, levando-se em conta a questão do preconceito que costuma vir dos parentes, amigos e vizinhos.
Outro ponto é a grande expectativa gerada em torno do bebê ou da criança, dando margem a fantasias na relação familiar. É importante ter em mente que não há filhos, pais e famílias perfeitas. Dessa forma, fica mais fácil administrar os conflitos e problemas que por ventura apareçam.
Infelizmente, há pessoas conscienciosas e outras sem noção. Li um caso de um casal que tentou engravidar, sem sucesso, e o médico deles indicou a adoção como alternativa, inclusive para ajudar numa futura gravidez natural. Após a adoção se concretizar, mais de um ano depois, a criança foi devolvida, porque o casal engravidou. Eles estão sendo processados. Eu, particularmente, achei essa postura muito adequada. Uma criança não é um boneco que podemos dispor “agora eu te quero, agora eu não te quero”, “agora você me serve e me é conveniente, agora não mais”.
O AMOR SUPERA QUALQUER BARREIRA
Aroldo Babosa, pedagogo e mestre em família na sociedade contemporânea, trabalhava na OAF – Organização do Auxílio Fraterno, em Salvador, e prestava auxílio a crianças com dificuldade de aprendizagem, nos anos 90. No seu caminho, se deparou com várias meninos e meninas. Um deles, em função da baixa acuidade visual que apresentava, demandou mais atenção de Aroldo. Seu nome é Carlos.
Garoto franzino, de 5 anos, com baixa visão e morando numa instituição de auxílio a menores, ao perceber o cuidado e atenção dispensados, olha para Aroldo e dispara: “Por que você não cuida de mim”?
Aroldo, homem, solteiro, sem planos de exercer a paternidade em sua vida, é pego de surpresa!!! O que fazer?! Decidiu ser pai de Carlos, que hoje tem 22 anos, mora sozinho em São Paulo, estuda música e toca numa orquestra. Até em Jô Soares ele já se apresentou.
Ao falar acerca da sua experiência, Barbosa desconstrói outro mito: “Quando se fala em adoção se pensa que o benefício é da criança e não de quem está adotando. Carlos mudou minha vida. Não consigo imaginá-lo filho de outro homem que não seja eu”.
JULGUE MENOS, AME MAIS
O ser humano ainda tem a tendência de se ater a coisas de menor importância e colocar lente de aumento nas questões negativas. Em relação ao tema Adoção, não ocorre o inverso, infelizmente. Apesar de a maioria das experiências serem exitosas, os casos divulgados são aqueles que resultaram em algo negativo, o que colabora para perpetuar uma imagem equivocada de que ‘quase sempre’ a adoção não dá certo.
Como bem colocou Djalma Argollo, terapeuta junguiano e escritor, é preciso combater qualquer tipo de preconceito e repensar o queremos como sociedade. A pressão social é um problema e cobra, às vezes, de uma maneira cruel algumas posturas que marcam e estigmatizam pessoas e isso já traça um preconceito. O grande processo educativo nosso, do século 21, é o trabalho contra o preconceito, contra o diferente, contra aquilo que não é “normal”, porque o normal é culturalmente aceito como normal.
Cabe a nós rever o que o cultural estabeleceu como normal e reavaliar nossos conceitos, dispensando o que não serve e não cabe mais. Definir quais são os valores que a gente quer como sociedade, como bem frisou Maurício Magalhães, publicitário e timoneiro da premiada Agência Tudo.
Não se deve pensar na adoção como algo apenas biológico, pois o que perpetua é o nome da família e não somente o sangue. “ Se nós damos o amor, a diretriz e o exemplo ao filho, venha ele como venha, ele será uma pessoa digna, pois é a nossa dignidade que vai dar a eles a condução para o resto da vida”, conclui o terapeuta Argollo, deixando a todos nós uma grande lição.
Então, deixemos de lado essa necessidade quase compulsiva de achar que cada coisa e situação precisa ser rotulada. Pois, amor é amor... Não deriva de laços de sangue e brota naturalmente, nem sei de onde. Tem uma força tão poderosa, que preenche tudo. Ninguém consegue explicar direito, mas todo mundo entende... Ah...se entende! Então, ame mais e julgue menos.
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